DEUS NA TERRA: IMPERADOR DOMICIANO. A REINVENÇÃO DE ROMA NO FINAL DO SÉCULO I.
Dinastia flaviana, os deuses na terra
A expressão "deuses na terra" aplicada à dinastia flaviana (69-96 d.C.) refere-se à prática, comum no Império Romano, de divinizar os imperadores, principalmente após suas mortes. Essa prática, conhecida como culto imperial, tinha diversas funções políticas e religiosas. No caso dos flavianos, embora Vespasiano tenha sido mais pragmático em relação à sua própria divinização, seus filhos, Tito e principalmente Domiciano, exploraram essa ideia com mais ênfase.
Contexto do Culto Imperial:
Origens: O culto imperial remonta à divinização póstuma de Júlio César, que abriu caminho para a prática de divinizar os imperadores.
Funções: O culto tinha como objetivo:
Legitimar o poder do imperador: Ao ser divinizado, o imperador transcendia o status de mero mortal e se tornava um intermediário entre os deuses e os homens, fortalecendo sua autoridade.
Unificar o império: O culto imperial oferecia um ponto focal comum para as diversas culturas e religiões dentro do vasto Império Romano, promovendo a coesão e a lealdade ao imperador.
Propaganda: A imagem do imperador como um ser divino era utilizada como ferramenta de propaganda para exaltar suas virtudes e seus feitos.
Os Flavianos e a Divinização:
Vespasiano (69-79 d.C.): Vespasiano, o primeiro imperador flaviano, foi mais pragmático em relação à sua própria divinização. Embora tenha sido divinizado após sua morte, ele não incentivou ativamente o culto durante seu reinado. Há até uma famosa anedota sobre ele, em seus últimos momentos de vida, dizendo: "Vae, puto deus fio" ("Ai, acho que estou me tornando um deus"). Essa frase demonstra uma certa ironia e distanciamento em relação à prática.
Tito (79-81 d.C.): Tito, filho de Vespasiano, teve um reinado curto, mas popular, marcado pela resolução de grandes desastres, como a erupção do Vesúvio e o incêndio de Roma. Após sua morte, foi divinizado pelo Senado, como era costume.
Domiciano (81-96 d.C.): Domiciano, irmão de Tito, foi o imperador flaviano que mais enfatizou o culto imperial durante seu reinado. Ele adotou títulos como Dominus et Deus ("Senhor e Deus") e incentivou ativamente o culto à sua pessoa. Essa postura autocrática e a promoção de seu próprio culto divino geraram grande oposição entre a elite romana, principalmente o Senado, e contribuíram para sua queda e assassinato.
Implicações da Divinização dos Flavianos:
Consolidação da Dinastia: A divinização, mesmo que póstuma para Vespasiano e Tito, ajudou a consolidar a legitimidade da dinastia flaviana, que havia chegado ao poder após um período de guerra civil.
Centralização do Poder: A ênfase no culto imperial, principalmente durante o reinado de Domiciano, fortaleceu o poder central do imperador e diminuiu a influência do Senado.
Reações da Elite Romana: A postura de Domiciano em relação ao culto imperial gerou tensões com a elite romana, que via com desconfiança a concentração de poder nas mãos do imperador e a promoção de seu próprio culto divino.
Conclusão:
A expressão "deuses na terra" aplicada à dinastia flaviana reflete a prática do culto imperial, que era uma parte importante da religião e da política romana. Embora Vespasiano tenha sido mais reservado em relação à sua própria divinização, seus filhos, principalmente Domiciano, exploraram essa prática com mais ênfase, buscando fortalecer seu poder e sua imagem. Essa postura, no entanto, também gerou tensões e contribuiu para o fim da dinastia.
É importante notar que a concepção romana de divindade era diferente da concepção monoteísta. A divinização de um imperador não significava que ele se tornava o único deus, mas sim que ele era elevado a um status divino, associado aos deuses do panteão romano.
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