Estilista, desenhista, artista visual, figurinista: difícil definir, em poucas palavras, a infinita alma criativa do mineiro Ronaldo Fraga, de 56 anos. Exuberante no vestir e no discurso, ele se auto intitula um homem que vive de ideias e imagens, e hoje cria coleções de roupas, em tiragens pequenas, que expõe em sua loja localizada dentro do Mercado Municipal, no centro da capital mineira, onde vive. “Ali é possível ver as costureiras trabalhando, entender o processo. O fazer é encantador e essa emoção me interessa, mais do que exibir um simples produto em série nas araras”, diz ele, que confessa não conseguir passar muito tempo parado.
“Minha vida agora vai muito além da moda. Adoro andar por esse país, seja capacitando mão de obra de artesãos, em oficinas, ou levando grupos para roteiros que revelam um Brasil autêntico, fora dos tradicionais guias de viagem”, revela ele, que se uniu aos irmãos turismólogos Pablo e Thiago Buriti, da agência paraibana Q-vizu, e é o mestre de cerimônias de experiências imersivas, de cerca de 5 dias, em lugares como a região do Cariri da Paraíba ou o sertão mineiro de Guimarães Rosa. “O Brasil profundo já funcionava como influência e inspiração para meu trabalho. Agora eu compartilho esses lugares e personagens com grupos de até 20 pessoas que se interessam em conhecer esse meu olhar e caem na estrada em uma van das mais animadas”, diz ele.
Verdade que esses roteiros, que hoje já somam quase 15 expedições realizadas, tomam boa parte da movimentada agenda de Ronaldo, mas como um homem múltiplo ele ainda consegue tempo para (muito) mais. Recentemente, lançou o livro “Memórias de um estilista coração de galinha”, em um formato de entrevistas, que conta sua vida e processo criativo desde os primórdios, passando por inúmeros desfiles e participações em semanas de moda. A edição é resultado de uma “saga”, como ele mesmo define, e foi resultado de inúmeras entrevistas organizadas pela jornalista mineira Sabrina Abreu, durante um período de 9 anos.
“Pegava o Ronaldo para conversar em qualquer lugar que ele estivesse, até no táxi indo para o aeroporto. O processo foi longo e bem caótico, mas entendi que essas personalidades interessantes são assim mesmo, nada convencionais e totalmente transformadoras. No final da nossa intensa convivência, posso afirmar que, sem sombra de dúvida, conheci a fundo um gênio, um visionário da era contemporânea”, afirma ela.
A moda entrou na vida de um Ronaldo ainda jovem quando, com menos de 10 anos, começou a desenhar de forma intuitiva. “Acabei indo trabalhar fazendo croquis de roupas prêt-à-porter em uma loja de tecidos”, diz ele. A carreira começou aí e logo ele percebeu que tinha um talento nato. Depois de cursar a faculdade de estilismo na UFMG, fazer pós graduação na Parson's School of Design em Nova York, com passagem também pela Saint Martins em Londres e ganhar inúmeros prêmios - inclusive sendo duas vezes escolhido pelo Design Museum britânico como um dos dez estilistas mais relevantes do mundo - ele hoje diz que a moda foi, acima de tudo, a ferramenta que o fez ganhar o mundo mas, principalmente, descobrir o Brasil real.
“Percorro o país há mais de 20 anos, para o desenvolvimento de coleções, trabalhando com pequenas comunidades de artesãos, com oficinas para rendeiras e bordadeiras, por exemplo. Essa vivência me trouxe um olhar muito amplo para o interior, para o fazer à mão. Foi um caminho sem volta”, revela. Mais do que apenas uma busca profissional, as viagens fizeram de Ronaldo o observador que ele sempre quis ser, um viajante que reflete as palavras do “Turista Aprendiz”, de Mário de Andrade, que ele cita como um mantra criativo: “O Brasil é uma síntese do mundo”.
Hoje, Ronaldo confessa que a passarela ficou pequena. E que os projetos, que incluem desde figurinos para teatro - como o do Grupo Corpo, em 2002 -, e, ano que vem, assina a direção criativa do Festival Tudo é Jazz, de Ouro Preto, enchem seus olhos de prazer e satisfação. “Penso na moda como um carnavalesco, que gosta de encantar. Uma ferramenta para contar histórias. Entendi que, do alto dos meus 56 anos, já posso fazer o que eu quiser. E uma coisa é certa; se é para sair de casa, que seja para me divertir. E se for para trabalhar, tem que ser em algo que eu realmente acredito”, arremata.
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Produção e reportagem: Simone Raitzik. Direção, câmera e edição do vídeo: Felipe David Rodrigues. Imagens adicionais: Ronaldo Fraga, Eleonora Meira de Vasconcellos, Junior Silva, Kant Rafael, Opera Plural, Foto Afetivo, Naty Torres. Editor responsável: Renato Henrichs.
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